O meu Tio Manuel
Conheci pouco o meu Tio Manuel Alfredo. Privei pouco com ele. Não tenho por isso nenhuma história particular para contar. Restam-me algumas memórias de encontros esporádicos em família e um sentimento de referência ou, se quiserem, de legado familiar, que cada um de nós procura manter nas suas vidas pessoais e profissionais. E é isso que julgo poderá ser interessante partilhar.
Conheci o meu Tio Manuel Alfredo tinha 12 anos. Pela mesma altura conheci a minha Tia Maria Emília, sua mulher, a maioria dos meus primos, respectivos maridos/mulheres, os filhos destes – meus primos em segundo grau, mas mais próximos de mim na idade – e a minha Tia Maria Palmira, sua irmã. O 25 de Abril de 1974 acontecera há poucos meses e tornara isso possível.
Até essa altura, a minha família paterna, era quase um mistério. Ouvia falar dos meus avós, dos meus tios e dos meus primos, mas não os conhecia. Nem me lembro de fotos que me permitissem dar caras aos nomes. Mas o mistério também não era assim tão grande. Afinal, por razões diferentes, mas de alguma forma relacionadas, conhecera os meus dois irmãos mais novos, alguns primos paternos e a minha Tia Maria da Conceição – casada em primeiras núpcias com o meu Tio Manuel – apenas dois anos antes. Em tom de brincadeira, dizíamos – e ainda dizemos – que éramos uma família de nómadas. Desencontrados. Mal sabia eu porquê.
Curiosamente, nas acções de sensibilização sobre a segurança online de crianças e jovens em que participo no âmbito do Projecto MiudosSegurosNa.Net, costumo referir a facilidade de acesso à informação e à comunicação – escrita, áudio e vídeo – como dois dos grandes benefícios das tecnologias de informação e comunicação para crianças, jovens e adultos. Houvesse Internet e, estou certo, teria conhecido o meu Tio Manuel e a minha família paterna mais cedo. E, estou certo, que foi por isso também que o meu Tio Manuel Alfredo lutou. Para que pais, filhos, netos, avós, tios, sobrinhos e primos, não fossem forçados a viver longe das suas famílias, por delitos de opinião.
À luz disto, talvez para mim, o legado do meu Tio Manuel e da minha família paterna seja este. Que tão importante quanto a protecção e a segurança de crianças e jovens, seja a protecção e a promoção da liberdade de expressão. Na Internet e fora dela. E que nunca uma deverá pôr em causa a outra.
A terminar, não posso deixar de referir que, nas minhas deambulações pelo país no âmbito do Projecto MiudosSegurosNa.Net, é habitual vir alguém ter comigo e perguntar-me timidamente: "O seu nome é-me familiar. Por acaso, é familiar do Tito de Morais, do Partido Socialista?". Ao que timidamente, respondo sempre com orgulho: "Sim, sou sobrinho. Era irmão do meu Pai". Por vezes, depois desta curta apresentação, lá vem uma história. Mais uma história que me permite conhecer um pouco melhor o meu Tio Manuel. Histórias e depoimentos como os quem têm sido partilhados neste blogue e que me estão a permitir conhecê-lo melhor. E dar a conhecê-lo aos meus filhos. Obrigado por isso.
Tito de Morais
(recebido por email em 2009.12.02)