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CCTM

Comemorações do Centenário do nascimento de Manuel Tito de Morais

25
Mar10

Tito de Morais - Um Homem de Princípios e de Solidariedade

Maria José Gama

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Imediatamente após o 25 de Abril, Tito de Morais exilado político por largos anos, regressou ao seu querido país com incontida emoção e enorme alegria. Esta, naturalmente, não isenta de orgulho pela vitória dos valores da Liberdade.

Ao entrar em Portugal com Mário Soares e Ramos da Costa e ao ser recebido tão gloriosamente pelos portugueses, viveu com intensa exaltação esse inesquecível momento. Automaticamente, o seu pensamento foi para os correligionários, seus companheiros de luta, que já não assistiram a esta mudança tão sonhada por todos.

Nesse regresso vieram-lhe à mente imagens do seu exílio. Quer da sua passagem por França, primeiro país onde se acolheu, quer do Brasil e da Argélia onde a par da sua actividade como Engenheiro foi um dos responsáveis pelo lançamento na Rádio da "Voz da Liberdade" que todo o Mundo ouvia com enorme interesse pela excelência dos textos noticiosos e também pelas vozes inconfundíveis de Tito de Morais e de Manuel Alegre. Sendo igualmente de assinalar, o facto de haver nessa Rádio uma locutora, então Jovem Jornalista, que também fora obrigada a exilar-se, Luísa Tito de Morais.

Curiosamente, também recordou a Conferência Internacional da Juventude para a Segurança Europeia, realizada em Florença de 2 a 5 de Dezembro de 1971 e a parte da sua intervenção em que como representante da ASP afirmou:

* "Para a Acção Socialista Portuguesa superar os blocos políticos e militares significa vencer uma batalha na luta contra a alienação do homem, contra o Imperialismo, contra a sociedade capitalista. Significa ainda ter confiança na solidariedade entre os homens, em particular na solidariedade que deve unir as massas trabalhadoras de todos os países do mundo e que deve unir todos os jovens que são a garantia do futuro"

Enquanto o comboio avançava para Lisboa, afluiu-lhe ao pensamento que tinha de voltar a Itália a fim de fazer a mudança da sua residência de Roma para Lisboa e de se despedir dos amigos bem como dos seus Camaradas italianos que costumavam ajudá-lo na feitura do Portugal Socialista que clandestinamente editava e enviava para os emigrantes portugueses e ainda para os resistentes anti-fascistas que residiam em Portugal.

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Assim aconteceu, depois da grande festa comemorativa do 1º de Maio, que todos vivemos com grande entusiasmo e euforia, foi com Maria Emília, sua mulher, a Roma para orientar o seu regresso definitivo a Portugal.

Antes de partir disse a Mário Soares que ele, Tito, se responsabilizaria pela organização do Partido Socialista, bem assim da preparação e coordenação do processo para a sua legalização. Nesse sentido, sob a orientação de seu irmão Augusto e seu filho João, deixou a funcionar um atendimento, provisoriamente instalado num andar na Duque d’Ávila, pertença de uma Cooperativa de Estudos, cujo responsável era Lopes Cardoso.

Foi nesse andar da Duque d’Ávila que mais tarde começaram a funcionar as primeiras secções do PS – sectoriais e de residência foi - também aí que conheci pessoalmente Tito de Morais e que tive o privilégio de com ele colaborar. Pois, precisamente no dia 1 de Maio de 74, comunicara a Teresa Loureiro, que conhecia desde o Liceu D. Filipa de Lencastre, da minha disponibilidade para colaborar e apoiar o PS.  E, logo na manhã do dia 3 a Teresa telefonou-me a pedir para ir para lá, porque além dela só lá estava a Maria Antónia Catanho de Menezes e uma outra Senhora.

Claro que correspondi de imediato à chamada. A minha militância activa começou desde esse dia. Fi-lo como uma homenagem póstuma a meu Pai, José Carvalho dos Santos, que fora um jovem político interveniente na Iª República e que, entre outras acções, exerceu as funções de Chefe de Gabinete do Presidente do Conselho de Ministros Francisco Cunha Leal, Deputado da Nação pelo círculo eleitoral de Viseu e Governador Civil de Viseu. Em princípios de 1933, resolveu exilar-se voluntariamente para Angola onde exerceu com reconhecido saber a advocacia. Esta resolução deveu-se à sua defesa intransigente e publica pela autonomização das colónias, opondo-se às resoluções do Acto Colonial de 1930 bem como pela sua discordância com a política da governação autoritária de Oliveira Salazar, quer como Ministro das Finanças, quer posteriormente, como Presidente do Conselho de Ministros.

Anteriormente ao exílio Tito de Morais, devido às perseguições da PIDE, que impunha às Empresas que lhe davam emprego que o despedissem, fora viver para Luanda. Nesse período, antes de ser preso, conseguiu exercer a sua profissão e, discretamente, também actuar politicamente. Nessa sua acção contactou alguns oposicionistas ao regime de Salazar, entre os quais meu Pai, que vivia em Benguela. Devido a esse esforço conjunto, quer em Luanda, Benguela e em muitos outros distritos de Angola, contrariamente ao acontecido na então Metrópole, Humberto Delgado ganhou as eleições.

Pela admiração que a figura de Tito de Morais sempre me inspirou, foi-me particularmente gratificante tê-lo conhecido, ter tido o privilégio da sua amizade, de o ter entrevistado em Abril de 1991 e consequentemente ter elaborado a sua Biografia.

Ao evocar Tito de Morais, não posso deixar de referenciar o seu filho, João, que sentia fortemente a responsabilidade dos valores que herdara dos seus maiores.

Entre outros episódios políticos que vivemos no período pós 25 de Abril, em que ainda se lutava pela estabilidade da democracia, retenho na memória o seguinte facto. Estávamos na Duque d’Ávila. O João recebera um telefonema de um capitão de Abril, que na qualidade de membro do MFA, a funcionar na Cova da Moura, fora incumbido da cedência de edifícios aos partidos para a instalação das suas sedes. Este Oficial perguntara-lhe se o PS aceitaria o palácio sito em S. Pedro de Alcântara, onde funcionara a censura e pedia-lhe para visitar o citado prédio. O João muito satisfeito convidou-me a ir também. Tinha de decidir e gostaria da minha opinião. Fez idêntico convite a mais duas pessoas, uma das quais foi à Maria do Carmo Maia Cadete.

Ambos fazem parte do álbum das minhas boas recordações. Inevitavelmente recordo sempre Manuel Tito de Morais e seu filho João Tito de Morais com enorme carinho, admiração e muita saudade.

 * Fonte – Conferência Internacional da Juventude para a Segurança Social – Florença, Dez. de 1971 – Pensamento retirado da sua Intervenção que se encontra no Espólio.

© CCTM (77)

23
Mar10

Fundador de fundadores

CCTM

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Tito fundador. Fundador dos fundadores!

Porque ele apareceu muito jovem naquela linha de pessoas de pundonor que nunca aceitaram um golpe contra a República, nem a ditadura, nem o chamado Estado Novo, nem o fascismo, nem a guerra colonial... Foi dos que persuadiram os amantes da liberdade, mais de que de uma esperança – da necessidade de combater. Dos que, entre eles, induziram a convicção da urgência em organizar.

 Dos que provaram, em palavras e actos, o imperativo da acção revolucionária. Dos que fundaram – aliás com a compreensão, o apoio e o entusiasmo de uma companheira não menos empenhada – a Acção Socialista, o Portugal Socialista, o Partido Socialista. Dos que arreigaram, neste Partido, a consciência de dever combater em todas as frentes onde a liberdade periga. Dos que elevaram a voz – ele é a voz! – que não permitiria que o Partido fosse outra coisa senão o devir, em contextos sucessivos, do próprio Partido, tirando forças sempre novas dos seus valores.

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Não lhe devem estar só obrigados, todos os militantes, mas os democratas e o País. Ele empurrou, na verdade, uma aventura que tardava da história do País e dela permanece como actor que nunca deixou a cena, a incomparável testemunha que nos ensina uma leitura e nos fornece a melhor referência. Nesta homenagem se comprova a larga extensão da base política e social que o reconhece.

Coimbra Martins

Fonte: Portugal Socialista 214 – Outubro de 1996

© CCTM (76)

14
Mar10

Acção Socialista

CCTM

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Na semana de 28 de Junho a 2 de Julho vão decorrer um conjunto de iniciativas que visam homenagear o fundador do PS, Manuel Alfredo Tito de Morais, referência moral e cívica de todos os socialistas, que dedicou a sua vida aos valores da igualdade, liberdade e fraternidade, o que lhe valeu durante a ditadura do Estado Novo o exílio e a prisão.

Continue a ler no Acção Socialista nº 1345 de 2010.03.11 (link indisponível)

© CCTM (75)

12
Mar10

Infância

CCTM

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Manuel Alfredo Tito de Morais nasceu em Lisboa a 28 de Junho de 1910 e faleceu a 14 de Dezembro de 1999. Seus pais, Tito Augusto de Morais e Carolina Loureiro de Macedo de Morais, viviam então na freguesia de S. Sebastião da Pedreira, na actual Rua Viriato. Manuel, o mais velho de três filhos, bebeu cedo os valores da democracia e da liberdade. Tinha pouco mais de três meses quando foi implantada a República em Portugal com a participação activa de seu Pai, oficial da Marinha, que em 5 de Outubro de 1910 comandou o cruzador São Rafael que bombardeou o Palácio das Necessidades, empurrando a família real para Mafra e daí para o exílio.

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Tito Augusto de Morais, destacado militante do Partido Republicano, saiu do Quartel de Marinheiros, em Alcântara, a 4 de Outubro de 1910, comandando um pelotão que teve um primeiro embate com as forças monárquicas naquele local. Regressadas as tropas ao quartel, Tito Augusto de Morais, na altura 2º Tenente da Marinha, foi nomeado para ir tomar o comando do cruzador São Rafael. Fez desembarcar o comandante, que tinha sido ferido, e, como nenhum dos oficiais que estavam a bordo quisesse aderir ao movimento, deu-lhes ordem de prisão e mandou-os para o Quartel de Marinheiros. Dirigiu nos dias 4 e 5 de Outubro todas as operações que o navio teve de efectuar no Tejo até à proclamação da República. Pela sua actuação foi promovido por distinção e o Parlamento da República atribuiu-lhe o título de Benemérito da Pátria.

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Desempenhou diversos cargos após a implantação da República, nomeadamente foi deputado às Constituintes de 1911, senador até 1913, Capitão dos Portos da Índia, de 1913 a 1916, ministro da Marinha em 1919, chefe da secretaria dos Serviços da Marinha, de 1924 a 1925, Governador-Geral da Índia em 1926, e Chefe de Serviços da Marinha, de 1926 a 1928 e manteve actividade política anti-fascista até ao fim da sua vida.

Quando Ministro da Marinha financiou, com duzentos contos, os preparativos para a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, realizada pelos oficiais da Marinha Gago Coutinho e Sacadura Cabral.

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Carolina Loureiro de Macedo de Morais, a Mãe de Manuel Alfredo, era uma senhora de grande inteligência, cultura e sentido de humor, considerada por muitos o “motor” da família.

Manuel Tito de Morais teve uma infância aberta e feliz, viajou para a Índia com os pais e estudou em colégios privados e públicos, como o Colégio Académico, o Liceu Camões e o Colégio Militar.

Texto: Extracto da fotobiografia em construção (CCTM - GT Fotobiografia - 2010)

Imagem: Arquivo Municipal de Lisboa e Espólio de Tito de Morais

© CCTM (74)

08
Mar10

Divulgação

Luis Novaes Tito

"Manuel Alfredo Tito de Morais não é só um fundador e o grande construtor do Partido Socialista. É acima de tudo uma referência de vida, um exemplo de integridade, um marco de coerência que importa ter sempre presente, principalmente por nos dar pistas de como agir quando as coisas não estão fáceis.

Foi com orgulho que aceitei ser o coordenador da Comissão Executiva das Comemorações do Centenário de Manuel Tito de Morais, não pelo cargo ou título, coisas a que pouco ligo, mas pelo que isso representa de confiança pelos meus pares da Comissão Executiva.

Espero conseguir, convosco, estar ao nível de mais esta nobre missão. Por ele, mas principalmente por nós, portugueses de honra.

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Com este apelo feito no meu Blog pessoal muitos foram os que se manifestaram das mais diversas formas e também nas redes sociais, no Facebook e em Blogs.

A sociedade da informação é uma realidade que no tempo do Tito ainda estava a dar os primeiros passos em Portugal, mas que hoje se afirma de forma espontânea.

A batalha de Tito de Morais tem agora forma nova, mais incontrolada, mais indisciplinada mais absolutamente livre e tenho a certeza de que lhe agradaria porque o Tito era um homem frontal a quem o contraditório e os desafios não incomodavam. 

Com ópticas diferentes ficam dois pontos de vista recolhidos em Blogs portugueses de referência sobre as comemorações do Centenário:

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No Macroscópio


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e no Água Lisa.

 

 

 

 

Não os comento (tenho a certeza que se fosse o homenageado a escrever este texto os comentaria com a sua frontalidade de sempre e faria a defesa do PS através do que está inscrito na Declaração de Princípios do Partido Socialista), só aproveito para agradecer a cada um deles não ter deixado que a memória de Manuel Alfredo Tito de Morais caia no esquecimento.

Deixo igualmente um especial agradecimento a Joana Lopes que, tanto no Blog Entre as Brumas da Memória como no Caminhos da Memória, tem ajudado a promover a divulgação desta homenagem.

© CCTM (72)

04
Mar10

Foi uma luta difícil

CCTM

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Não vou fazer uma apreciação do Tito de Morais como cidadão e político, uma vez que outros Camaradas que contactaram mais intimamente com ele já o fizeram de maneira exaustiva. Vou falar sim, do meu Camarada e Amigo, militante em vários comícios, colega em dois governos e como candidato a Deputado do Partido Socialista pelo círculo de Viana do Castelo.

 

Como foi para mim reconfortante ver no FacebooK (Cctm Tito de Morais) a foto de um comício na Fonte Luminosa onde me revejo em companhia do Tito, do Mário, do Zenha, do Campinos, do Aires Rodrigues, entre muitos outros! Mas que grande PS! Que saudades da «chama» de então!

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Em relação à nossa convivência estreita no Governo liderado pelo Almirante Pinheiro de Azevedo, ele, ligado ao Emprego e eu à Segurança Social, vivemos momentos extremamente complexos numa altura conturbada da vida política do País. Recordo que no 25 de Novembro estávamos no Governo. Nesses tempos difíceis o Tito revelou-se sempre um Homem de grande serenidade e com fortes convicções no Socialismo em Liberdade como defendíamos. Este seu entusiasmo foi contagiante para aqueles que tinham, na altura, menos experiência política. Então, a coragem e a determinação de Tito de Morais foram uma pedra basilar para o nosso ânimo e forte determinação na defesa dos princípios defendidos pelo PS!

Continuámos esta luta no 1º Governo Constitucional, já sob a liderança do comum Amigo Mário Soares, então com uma perspectiva de projecto mais segura e com uma orientação política muito mais bem definida. Lembro os contributos dados pelo Tito e pelo nosso também saudoso Jorge Campinos no problema do apoio aos retornados.

Mais tarde, travámos uma luta difícil e para muitos considerada quase que impossível, no distrito de Viana do Castelo... Durante um mês de campanha eleitoral, diariamente, percorremos todo o distrito, levando as nossas propostas a locais onde nunca as palavras Democracia, Liberdade e Socialismo tinham sido ouvidas...Fomos a locais cujo acesso teve de ser feito a pé devido à falta de caminhos transitáveis… Lembro que a uns quilómetros do Lindoso, depois de fazer cerca de uma légua a pé, fomos recebidos em casa de habitante de uma aldeia de que não recordo o nome, que nos ofereceu como refeição, a única coisa que tinha: uma batata cozida e uma tira de carne que tirou da salgadeira. Era este o espelho do Portugal profundo!

Oferecemos-lhe um copo com o emblema do PS que guardou religiosamente…

Durante toda a campanha, à nossa esquerda, o PCP, disfarçado de MDP, atacava-nos, tentando encostar-nos à direita… aí o Tito respondia com o seu exemplo de militante de sempre! À nossa direita existiam nichos ultra-reaccionários que, por estratégia, ignorávamos. Existia, também um numeroso grupo de tradição conservadora e muito influenciado pelo clero local que nos tentava «colar» aos comunistas, fazendo de cada homilia um comício dominical. A todos respondíamos com a nossa tolerância religiosa, os nossos princípios éticos e morais, focando as nossas intervenções no erradicar das desigualdades existentes no campo social naquele Distrito tendo sempre a tónica da Democracia e do Socialismo em Liberdade! Foi uma luta difícil, com muito trabalho, muita determinação, mas extremamente estimulante! O esforço teve como resultado a nossa eleição como deputados para a Assembleia da República por esse Distrito!

A maior gratidão que tenho para com o Tito é viver segundo o legado que ele e também o Mário e o Arnaut me transmitiram com o seu exemplo e que vincou a minha maneira de estar e sentir para todo o sempre… é ser: «socialista, republicano e laico»!

É esta a minha sincera homenagem!

Fevereiro de 2010

Vítor Vasques

© CCTM (71)

02
Mar10

Memória de um Amigo

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Tito Morais foi-me apresentado em Paris por Mário Soares, num fim-de-semana de reuniões políticas no âmbito das actividades da então Acção Socialista Portuguesa, organização que precedeu e deu origem ao Partido Socialista actual.

Estávamos na segunda metade dos anos sessenta, ainda com Salazar no poder, a guerra de África já instalada nas três colónias de Angola, Moçambique e Guiné e uma repressão política violenta e selectiva.

Os jovens eram mobilizados em massa para a guerra e a oposição na Universidade, após um auge de movimentação estudantil na crise de 62 e nas lutas de 65, estava decapitada pelas prisões e exílios que dizimaram o movimento. Cá dentro, os que escaparam, tentavam reanimar o movimento estudantil mantendo as Associações dos Estudantes em funcionamento e mesmo com algum desenvolvimento nas suas actividades desportivas, pedagógicas, turismo estudantil e sociais. A coordenação inter-associações foi-se mantendo a nível local e nacional e em 67 organizou-se em Lisboa a primeira grande manifestação em Portugal contra a guerra do Vietname.

Mas o regime estava sólido, as Forças Armadas cumpriam a sua missão com lealdade ao poder político e longe estávamos da convicção generalizada que a guerra não era solução para o problema colonial.

Pela parte da Acção Socialista, era defendida uma abertura imediata de negociações com os movimentos de libertação, com compromisso dum caminho da auto-determinação e independência, caso fosse esse o desejo livre dos respectivos povos.

Tito Morais, o Tito como todos os mais chegados lhe chamávamos, não tinha qualquer dúvida que a solução acabaria por ser uma independência total das colónias, e que a doutrina salazarista dum só País pluricontinental não tinha qualquer viabilidade nem razão moral ou histórica, inviabilizando um concerto entre países livres e independentes, multirraciais, de língua portuguesa e de culturas com profundas raízes comuns e enormes inter-influências de séculos de convivência.

Salazar parece não ter conhecido o exemplo do Brasil e esqueceu, como uma “branca” definitiva lhe tivesse dado, a vergonha do Estado da Índia, cristã e portuguesa, que por falta de visão deixou perder.

A minha amizade e harmonia com o Tito não foi difícil de iniciar. Em adolescente tinha sido amigo próximo do seu filho João Manuel, meu colega no Colégio Moderno. Perdemos o contacto pois o João Manuel exilou-se para o Brasil e estivemos sem nos ver até Abril de 74.

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As nossas ideias eram em geral coincidentes, ainda que muitas vezes o considerasse demasiado radical. Talvez o facto de estar exilado em Roma lhe desse uma visão mais afastada de algumas situações que eu, que sempre vivi em Portugal, analisava de forma diferente. Nos princípios era inflexível, embora razoável e conciliador na acção política concreta.

Pela geração a que pertencia, pela sua formação e pela sua vivência, era claramente um homem de esquerda, aquilo que poderíamos chamar, da grande família da Esquerda Portuguesa.

Aquela ideia hoje divulgada por muitos que a distinção entra a Esquerda e Direita estão esbatidas quer pela “morte” das ideologias, quer pela necessidade da Sociedade e da Economia dum pragmatismo permanente e sempre presente em todas as grandes decisões, não tinham qualquer sentido para Tito Morais e apenas representavam uma forma nova, inteligente e insidiosa, de manter a exploração dos mais fortes sobre os mais fracos.

A minha situação profissional como quadro duma importante multinacional italiana da indústria farmacêutica fazia-me deslocar a Itália com alguma regularidade e, por vezes por períodos longos. Este facto fez com que visitasse o Tito e a Maria Emília, sua segunda mulher, amiúde. Sempre que podia dava um salto a Roma e ficava em sua casa, partilhando por alguns dias um quotidiano difícil, onde o dinheiro não abundava e, algumas vezes que por lá passei, senti mesmo que passavam mal.

Nesse tempo, no princípio dos anos 70, o Partido Socialista Italiano ajudava a Acção Socialista, particularmente na publicação do nosso jornal oficial que se chamava Portugal Socialista e que trazíamos à socapa para o interior do País.

Era Tito Morais que se encarregava de quase tudo, com ajuda da Maria Emília e do seu filho mais velho. Os artigos eram recebidos de diversas fontes de camaradas no exílio ou do interior, do próprio Tito e dum colaborador muito especial e dedicado que se chamava e chama, Mário Soares.

Mário Soares visitava frequentemente o seu amigo Tito, particularmente quando esteve exilado em Paris. Penso mesmo que terá sido quem mais o visitou nessa estadia forçada em Roma. Pelas razões atrás referidas creio bem que eu próprio fui o membro da ASP e posteriormente do PS, o português quem mais o visitou e partilhou as suas esperanças, a sua coragem e tenacidade na luta pela Liberdade em Portugal. Temos de nos organizar em todos os sectores da sociedade portuguesa, dizia, não só nas universidades e entre os intelectuais, mas também nos meios operários, nos serviços e nos meios rurais. Era sua convicção que o ideário do Socialismo em Liberdade, como lhe chamámos em 1969 ou Socialismo Democrático como lhe chamamos desde os anos 70, era maioritário em Portugal e que umas eleições livres e participadas o iriam demonstrar. Tinha toda a razão.

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Pessoas como o Tito fazem falta e fazem-nos muita falta. São referências permanentes que, quando presentes nos estimulam à acção e à constante atenção na coerência dos nossos princípios com os nossos procedimentos.

Aproveitemos o centenário deste herói da Resistência e da Liberdade para revisitar os princípios que fazem grandes as nações. Os princípios da liberdade, da solidariedade e da convivência humana com tolerância, responsabilidade e respeito pelo próximo.

Lisboa, 31 de Janeiro 2010

Pedro Coelho

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28
Fev10

Com imensa alegria

Luisa Tito de Morais

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Personalidades anti-fascistas, movimentos democráticos e o Partido Comunista Português decidiram criar, numa Convenção realizada em Roma em 1963, a Frente Patriótica de Libertação Nacional (FPLN). Por proposta de Tito de Morais a sede da FPLN seria na Argélia, país recentemente independente e solidário com os movimentos de libertação – nomeadamente das colónias portuguesas – e a luta dos povos oprimidos. Pedro Ramos de Almeida foi, entre 1964 e 1969, o representante do PCP na FPLN. Seguiu, pois, para Argel com a sua família: eu e o nosso filho Nuno, de nove meses de idade.

Sem viver com o meu Pai desde os nove anos – embora passasse algumas férias com ele -, a possibilidade de podermos conviver, dele conhecer o meu filho e de estarmos na mesma luta encheu-me de alegria. Posso dizer, com verdade, que foi em Argel que o conheci melhor.

E gostei muito daquele Pai que me aparecia aos 22 anos de idade. Todo ele era ternura e solidariedade, mas ao mesmo tempo um líder, um combatente sem tréguas pela liberdade.

As nossas casas ficavam relativamente longe, mas todas as semanas íamos jantar a casa dele e aprofundar laços com os meus jovens irmãos Manuel e Luís e mais tarde com o Pedro, que nasceu em Argel.

O Pedro tem menos um ano do que o meu filho, seu sobrinho, e cheio de pressa nasceu algumas semanas antes do tempo. O meu Pai apareceu aflito em minha casa a dizer-me que a Maria Emília tinha ido para a maternidade. Numa correria, fomos os dois comprar o “enxoval” do bebé e levá-lo à maternidade. Fui eu que o vesti, lhe dei o nome e fiquei sendo sua madrinha.

Todos os dias estávamos juntos pois ele era dirigente da FPLN e eu trabalhava na sede. Eu era também locutora da “Voz da Liberdade”, a rádio da FPLN, e o meu Pai esteve na origem da sua fundação e foi o primeiro responsável por ela.

A rádio emitia duas vezes por semana, às quartas e sábados, e mais tarde também às segundas, e o meu Pai era um dos redactores. Lembro-me ainda de alguns dos seus textos – bem escritos, com uma linguagem simples e precisa.

A importância da rádio na luta anti-fascista deve ser sublinhada. Muito ouvida em Portugal, a par da Rádio Portugal Livre, dava uma informação livre de censura e mobilizava os democratas portugueses contra a ditadura e a guerra colonial. Tinha uma rubrica muito concorrida: o Correio da Voz da Liberdade. Dezenas de pessoas do interior e do exterior enviavam semanalmente cartas para o “13 rue Auber” e era normalmente Piteira Santos quem respondia. Fazia-o calorosamente e com um enorme prazer. Havia ainda outras publicações da imprensa escrita largamente difundidas. O trabalho da FPLN também foi essencial. Desde o MUD que não existia uma organização unitária tão forte, embora esta tivesse a sua actividade principal no exterior. Os membros da Junta Revolucionária Portuguesa (o órgão directivo da FPLN) deslocavam-se a vários países europeus e mesmo americanos, onde criavam núcleos de democratas aderentes, e chegaram a vir clandestinamente a Portugal. Participaram e/ou organizaram conferências internacionais sobre a situação em Portugal e aprofundaram laços com os movimentos de libertação nacional das colónias que também tinham escritórios em Argel e com os seus principais líderes.

As autoridades argelinas relacionavam-se com a FPLN considerando que esta representava o povo português e convidavam os seus dirigentes para assistir a comemorações e recepções. As representações diplomáticas acreditadas, nomeadamente as dos países socialistas, tomavam posição idêntica. Numa ocasião, em 1965, a Embaixada de Cuba convidou os responsáveis da Junta Revolucionária para uma recepção destinada a assinalar um momento muito especial: a presença de Che Guevara em Argel, que vinha participar numa conferência.

Argel foi um chão amigo para os exilados e para os desertores e refractários da guerra colonial.

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Quando, em 1963, o meu Pai se instalou em Argel, mobilou a sua casa com “móveis” feitos por ele. Com a madeira dos caixotes dos seus livros, que trouxera do Brasil, construiu uma mesa e vários bancos. As camas, inicialmente, resumiam-se a colchões no chão. Era um óptimo “bricoleur” e as suas habilidades estendiam-se à cozinha e ao “corte e costura”.

Mais tarde, com o trabalho do casal – o meu Pai era engenheiro electrotécnico nos Hospitais de Argel - foi comprando outra mobília e a sua casa tinha sempre as portas abertas para todos os portugueses refugiados.

Todas as festas, como o Natal ou a passagem do Ano, eram feitas em sua casa. Sabia receber como ninguém e com ele o exílio ficava menos triste.

As nossas longas conversas, que muitas vezes duravam horas, só se repetiriam depois do 25 de Abril, quando finalmente tivemos o direito de viver em Portugal. Voltei a ter Pai aos 32 anos.

Tenho de confessar que em 75 “brigámos” bastante pelos nossos pontos de vista, nem sempre convergentes, mas isso nunca obstaculizou a nossa infinita amizade.

A separação derradeira foi em 1999, com a sua morte. Mas o seu exemplo de Homem íntegro e carinhoso, democrata e combatente pela liberdade contínua ao meu lado.

Imagem: Manuel Tito de Morais com o neto Nuno Ramos de Almeida ao colo e, ao colo de Maria Emília, o seu filho Pedro Tito de Morais

© CCTM (69)

24
Fev10

Determinação

Luis Novaes Tito

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Com Tito de Morais, em Roma, e Ramos da Costa, em Paris, a ASP fazia-se representar nos Congressos de prestigiados partidos europeus e em conferências internacionais.

As arbitrariedades da ditadura e do colonialismo eram expostas e as manifestações de solidariedade para com os socialistas e os democratas em Portugal decorriam espontaneamente. 

Deputados socialistas em Itália levantam questões relacionadas com a falta dos direitos humanos em Portugal e manifestam no Parlamento solidariedade para com Mário Soares, quando esteve deportado em S. Tomé. 

A ASP cria laços de fraternidade com PS de Itália, o SPD na Alemanha, os Trabalhistas na Grã-Bretanha, os Sociais-democratas na Suécia e os Socialistas em França. 

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A esse propósito, Mário Soares, no livro de Maria João Avilez, afirma: 

Nunca é demais enaltecer o trabalho realizado por Francisco Ramos da Costa e por Manuel Tito de Morais: um autêntico trabalho pioneiro, de verdadeiros cabouqueiros do socialismo democrático português.” - Soares acrescenta:

abriram-me as portas dos contactos internacionais, antes de eu chegar ao exílio, foram eles que me levaram ao Congresso de Eastbourne, em 1969, e depois de me fixar em Paris, a partir do Verão de 1970”.

(extraído da fotobiografia que está em construção)

© CCTM (68)

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Nota do Webmaster (2022)

Este Blog está, como se pode ler no "feed", selado para memória desde o dia 2010.07.29, data em que a Comissão Executiva das Comemorações do Centenário do nascimento de Tito de Morais se extinguiu.
O tempo (12 anos), em termos de evolução tecnológica, é inimigo das selagens e o Blog, para que continue a reflectir a memória, teve de ser tecnicamente “desselado” para manutenção.
Na minha qualidade de webmaster reactivei as imagens, uma vez que a base de dados onde estavam alojadas foi descontinuada, e procedi a alguns ajustes para permitir que este acervo se mantenha funcional. Estes trabalhos decorreram entre 14 e 25 de Setembro de 2022
Se em relação ao texto fica a garantia de praticamente nada ter sido alterado, com excepção de alguns links externos entretanto quebrados ou já inexistentes, já no grafismo original houve que fazer pequenos acertos.
A nota justificativa está registada na última (primeira) página do Blog.
Luís Novaes Tito
luismariatito@gmail.com
2022.09.25

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