Tito de Morais é uma figura incontornável do socialismo em Portugal. Homem de princípios, combatente contra a ditadura fascista e o colonialismo, lutador pela liberdade e pelo estabelecimento da democracia em Portugal, a sua acção política foi determinante para a criação do Partido Socialista.
Quando se comemora o centenário do nascimento de Tito de Morais e se impõe dar a conhecer a sua obra, não é demais repetir, ainda que numa brevíssima resenha, algumas notas da acção política do indomável resistente e combatente pelos ideais do socialismo.
Filho de revolucionário da instauração da República, a sua acção política iniciou-se cedo, tendo logo aos 16 anos participado numa greve de estudantes do Liceu Camões, episódio que lhe acarretou a agressão de um agente da repressão da ditadura. Foi o seu baptismo de fogo. Dir-se-ia que este incidente teve um efeito catalisador e Tito de Morais nunca mais parou na sua luta contra a opressão e pela liberdade.
O combate de Tito de Morais acarretou-lhe profundas atribulações a vários níveis. Sofreu várias prisões – entre outras, por integrar o MUD e participar nas campanhas eleitorais de Norton de Matos e Humberto Delgado – demitido de empregos, não podendo exercer uma actividade profissional como engenheiro, e por fim o exílio para onde foi empurrado. E foi nesta situação que Tito de Morais, longe dos esbirros da ditadura, deu largas à sua imaginação revolucionária e desenvolveu uma acção política consequente.
Em 1964, na Suíça, Mário Soares, Tito Morais e Ramos da Costa criam a Acção Socialista Portuguesa (ASP). Dois anos mais tarde foi decidido que Tito de Morais, depois de actividade política no Brasil e na Argélia, fixasse residência em Roma. Estavam criadas condições para uma nova fase de luta contra a ditadura.
Tito de Morais começou por dar especial atenção aos contactos na área internacional, participando em conferências e congressos de prestigiados partidos e organizações europeias, dando a conhecer a situação política em Portugal e obtendo significativos apoios para a luta dos socialistas no país.
O “Portugal Socialista”, criado em 1967, foi um instrumento de luta contra o fascismo e concebido para, no quadro da ASP, ‘contribuir para a estruturação política e organizativa dos socialistas portugueses’. Este tema da organização foi uma constante das preocupações de Tito de Morais, e não foi por acaso que no primeiro número desta publicação o tema é abordado e recorrente em várias edições seguintes.
Sendo este jornal uma publicação produzida em Roma, é de imaginar as dificuldades na sua distribuição em Portugal, obstáculo suplantado pela criatividade do fundador e director do jornal, Tito de Morais, tendo sempre conseguido que as edições circulassem em Portugal.
Outro aspecto a destacar foi o contacto com os emigrantes. A ASP era um movimento preocupado com a formação política e a intervenção dos trabalhadores. Não foi por coincidência que o “Portugal Socialista” foi fundado no dia 1º de Maio – o Dia do Trabalhador. Tito Morais promoveu encontros com trabalhadores em vários países europeus, de que resultou a criação de Núcleos ASP e que veio a reflectir-se de forma positiva no Congresso da fundação do Partido.
Em síntese, as acções políticas de Tito de Morais no exílio, com o empenho, a dedicação e o estímulo que promoveu em toda a sua actividade para o trabalho progredir, o recrutamento de militantes e a expansão da ASP, concorreram de forma decisiva para a criação das condições necessárias que levaram à fundação do Partido Socialista.
No Congresso da fundação, organizado sob sua responsabilidade, apresentou dois documentos: Política Interna da ASP e Problemas de Organização. É certo que são documentos datados, mas onde não falta espaço para alguma presciência política quando reflecte sobre o futuro, admitindo o derrube do regime fascista pelas forças armadas. Regista-se também a sua preocupação ideológica de uma comunidade solidária e fraterna ao afirmar “… não aceitar nada que possa comprometer a construção, embora por fases sucessivas, da sociedade socialista”.
Após a Revolução redentora dos militares de Abril, Tito Morais regressou a Portugal depois de 13 longos anos no exílio, não se deslumbrou por cargos de prestígio social e colocou todo o seu empenhamento na organização do Partido Socialista. Como 1º Secretário Nacional ficou instalado na sede nacional, dirigiu múltiplas áreas políticas e formou equipas que, sob sua orientação, implementaram o Partido a nível nacional.
Tito de Morais continuou a servir o Partido Socialista exercendo vários cargos, de que se destacam, a nível institucional, o de Presidente da Assembleia da República, e a nível partidário, o de Presidente do Partido Socialista. O ex-exilado, exercendo então funções do maior prestígio nacional, continuou igual a si próprio, na sua modéstia e integridade. Manteve-se durante toda a vida como o guardião dos valores do socialismo, e encontramo-lo, em Maio de 1992, no seu “Portugal Socialista”, a escrever: “Vem-se acentuando no seio do Socialismo democrático a tendência de, por razões eleitoralistas, se adaptarem os modelos neoliberais existentes que vão tornando os ricos cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres e, para mascararem esta tendência, afirmam que se trata de uma ‘MODERNIZAÇÃO’.”
Estas breves notas, de apenas alguns aspectos relevantes da acção política de Tito de Morais, são suficientes para o colocar na galeria da História do Socialismo em Portugal, como vulto do maior destaque que não se poupou a esforços na luta contra a ditadura, para a edificação do Partido Socialista e a institucionalização da Democracia em Portugal.
Tem sido para mim uma grande honra e forte emoção participar nesta bem merecida homenagem a Tito de Morais, com quem tive o privilégio de colaborar como companheiro de exílio, como camarada e como amigo.
A melhor homenagem que devemos prestar a Tito de Morais é prosseguir na defesa dos valores do Socialismo Democrático de que ele sempre foi porta-voz.
José Neves
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